sábado, 28 de abril de 2012

SOBRE A CPI DA PISTOLAGEM, POR WALTER RODRIGUES




WALTER RODRIGUES  ––  COLUNÃO no 014  –– SÃO LUÍS (MA) 14/12/1997

Já vai tarde a CPI da Pistolagem

Basta aspirar o ar da Assembléia Legislativa para saber de crime
É injusto dizer que a “CPI da Pistolagem” não serviu para nada, pois isso equivale a confundi-la com quem não ajuda mas também não atrapalha. A CPI atrapalhou e atrapalhou-se tanto, que até a pizza tradicional passou do ponto.  Se o próprio crime organizado assessorasse os trabalhos, não poderia desejar, dadas as circunstâncias, condução mais tímida ou desfecho mais inútil à segurança pública.

O máximo de ousadia que o relatório dos cinco cepeístas consegue é “denunciar” a existência de crime organizado no Maranhão, assim, como se eles tivessem descoberto a pólvora. Bastaria aspirar a fumaça dos próprios corredores da Assembléia para chegar à mesma conclusão.

No caso específico do assassinato do delegado Stênio Mendonça e da chacina do Bando Bel ––  fatos que originaram a investigação da Assembléia ––  a CPI deteve-se aquém das apurações da Polícia e das conclusões do Ministério Público. A delegada Dayse Aparecida identificou um por um os planejadores e executores da “queima de arquivo” dos matadores de Stênio, já agora devidamente denunciados pelo MP à Justiça. O inquérito parlamentar chegou ao fim sem tomar conhecimento disso, embora os intrépidos inquisidores sustentem que “forneceram elementos para a ação do Ministério Público”. Isso é piada se tomado a sério e como piada não tem a mínima graça.

As propostas da CPI resumem-se no velho chavão de que a polícia está “desaparelhada”. Está, e muito, mas isso não é tudo, nem é o fundamental. O fundamental é o crime organizado, com a participação de autoridades dos três poderes, conforme declaração do ex-governador João Alberto. O qual, apesar disso, nem foi convidado a depor. Apesar disso ou exatamente por isso?

Tampouco quiseram ouvir o deputado José Gerardo (PPB), apontado como suspeito pela viúva de Stênio, Marília Mendonça. Gerardo declarou repetidas vezes que estava pronto a prestar depoimento, mas foi inútil: a CPI  não estava pronta a ouvi-lo. Nem a ele nem ao deputado Francisco Caíca, cuja filha Stênio indiciara por envolvimento no escândalo da carreta roubada em 1995 pelo bando de Joaquim Laurixto. A carreta foi achada num imóvel pertencente a Laurixto e habitualmente utilizado por Gerardo e Caíca.

Tendo praticado esse ultracorporativismo, a CPI não desperta a compaixão de ninguém quando se queixa de que não lhe permitiram ouvir os juízes de algum modo relacionados com seu objeto de investigação. Por que os juízes deveriam atender ao chamado, se a CPI não se dera ao respeito de convocar nem os deputados, nem o secretário João Alberto? Só com muita boa vontade, o que obviamente os magistrados não têm.

A CPI também protagonizou episódios ridículos, como a inacreditável tentativa de promover uma “acareação” de Marília com delegados implicados na chacina do Bando Bel, ou como a revisão do Código Penal cometida pelo relator Francisco Atalaia, que chamou Stênio, diante da viúva, de “assassino” (Stênio matou um homem em legítima defesa, mas essa circunstância “não interessa, é assassino de qualquer jeito”, segundo Atalaia). Em compensação, o delegado Raimundo Brandão ––  indiciado e agora já denunciado à Justiça como co-autor intelectual da chacina do Bando Bel ––  mereceu elogios do presidente da CPI, deputado Getúlio Silva, só porque se declarou inocente...

De frente pro crime –– O espírito da CPI evidenciou-se neste diálogo do deputado Francisco Martins com o presidente da Associação dos Delegados, Aldir Teixeira, que defendia abertamente os policiais suspeitos:

–– O senhor acha que os membros da CPI correm algum perigo?
–– Não, porque os senhores estão fazendo um bom trabalho.
(Supunha-se, até então, que o perigo aumentasse na razão direta da eficiência da investigação e que “bom trabalho”, no parecer do delegado, fosse “mau trabalho”, do ponto de vista dos bandidos).

No capítulo dos pecados veniais, Martins protelou o início dos trabalhos  com um requerimento sem sentido, Pedro Vasconcelos deu o fora na primeira oportunidade (depois de insinuar que Marília manifesta “desequilíbrio”) e o petista Vila Nova, num acesso de provincianismo radical, gastou uma hora do depoimento do secretário de Segurança discutindo a proibição de um pagode de seus correligionários de Santa Rita.  Ou não era Vila Nova, mas apenas um sósia dele?

Na minha coluna de 31/8 no Jornal Pequeno, comuniquei o suicídio da CPI, admitindo que o velório se prolongaria até que o bem-estar do meio-ambiente exigisse o sepultamento. Só não contava que prolongassem as exéquias ainda por 90 dias, indiferentes ao mau cheiro.
Tem gente que erra porque não sabe e tem gente que erra porque não quer acertar. Fica a impressão de que a CPI não sabia e sobretudo não queria. Que a terra lhe seja leve.








Nenhum comentário: