sexta-feira, 1 de junho de 2007

Letra "L"

LAMBADA
[ Teve uma coisa engraçada [na viagem que ele fez aos Estados Unidos]: a estréia da
lambada. Foi triste, triste! Americano acha que você vai aos Estados Unidos para ir a
restaurante brasileiro, dançar música brasileira... Eu queria conhecer o Palladium, nos
anos 60 muita gente tinha tocado lá. Aí começa o show da lambada. Nunca vi uma coisa
tão brega! Um rufar de tambores e... Eu não sabia quem era Kaoma, nunca tinha ouvido. Só
que era uma armação de um empresário francês com músicos afro-franceses. Aquela
fumaceira, pareciam os números musicais do Fantástico bem brega de antigamente,
o fumacê azul, e todo mundo com a respiração presa, esperando a lambada. Até ali, estava
interessante: vídeo da Mangueira, aquele ambiente rococó vitoriano, uma coisa louca. E o
Olodum... Mas, quando começou a lambada! Pareciam aquelas dançarinas do Gugu
Liberato, e um dançarino com cara de chicano, com uma calça superapertada, e essa
chacrete com uma sainha, os dois parados. Aí: "Laambaadaa!". Parecia show da
Broadway brega, uns seis casais dançando, dava para ver que era tudo de Porto Rico
ou... do Brasil é que não era. E a banda... Tinha um da banda do Hugh Masekela, o
percussionista, com trancinhas do Senegal. Três meninas cantando, só uma brasileira.
Uma negona — a melhor parte do show — não tinha nada a ver com lambada, era
funkadelic. De hot pants, sapato de salto dessa altura e uma peruca loira de plástico,
cara! Depois da terceira música, eu fui embora. Eu juro que tentei... mas não deu. Aí,
saí, e ainda tinha gente querendo entrar. Me deu uma raiva! Me deu vontade de falar:
"Não é música brasileira!". Mas, Deus me livre! Prefiro que achem que sou judeu,
grego... (1990)
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LAURA PAUSINI
[ Laura Pausini foi uma das primeiras coisas que eu ouvi [para escolher
repertório para o disco Equilíbrio Distante]. Isso é a Fafá de Belém no
Domingão do Faustãol De repente, a riqueza melancólica e harmônica
que tem por trás disso me impressionou. Dentro da coisa pop, o nível
de produção do disco dela me impressionou. Eu adoro a melodia —
como músico, sabe? Têm uns clichês, mas, de repente, tem aquela coisa
da canção pop clássica. Ela fica repetindo a letra e, se você entra no que
ela está falando... (1995)
[ A gente teve que adiantar o lançamento do disco na rádio em São Paulo porque
eles começaram a tocar Laura Pausini. Nunca colocaram Laura Pausini em lugar
nenhum! Sabe, foi só aparecer na GNT o especial que a Beth Lago fez comigo que, no
dia seguinte, já estava tocando Laura Pausini, La solitudine. (1995)
[ Ela é como se fosse a Angélica dos italianos, toda mocinha (1995)
LEGIÃO URBANA
[ Nossa primeira apresentação foi no festival Rock na Arena, em Patos
de Minas. A segunda, um grande acontecimento tribal no Guará. A
terceira, na Ciclovia, Lago Norte. Não vamos desistir. Só queremos nos
divertir. Está tudo muito bem, está tudo bom demais, mas realmente
não iremos esquecer a música urbana. (1982)
[ Na minha cabeça, a Legião continua a fazer a mesma coisa que fazia
antes. A única diferença é que, ao invés de tocar para um público de
500 pessoas em Brasília, a gente está tocando para esses ginásios com
dez mil, 15 mil pessoas. (1985)
[ A melhor coisa é: nós quatro, do jeito que somos, termos conseguido
fazer o que fizemos. Gente, nós éramos uma banda underground! Até
hoje, eu não sei tocar direito. Agente é super não-profissional, é amador
no bom sentido, de quem ama o que faz. O importante é isso, mas as
pessoas ficam em cima — Rolling Stones/Mick Jagger, RPM/Paulo
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Ricardo... E não é Legião/Renato Russo. É Legião. Só que eu falo mais — eu sou muito
ambicioso —, dou sempre um jeito de falar a coisa certa na hora exata. As letras só
tentam provar que alguma coisa é possível, mas as letras são feitas em cima do que os
quatro vivem. (1987)
[ O que a Legião Urbana tenta fazer é provar que nos anos 80, no
Brasil, você ainda pode tentar seguir o caminho que eu aprendi com o
Dylan e os Stones e quem quer que seja. Que a gente possa ser a trilha
sonora verdadeira, factual. Para quando tiver um programa sobre
ecologia, eu não precise ir lá debater ecologia: basta colocar as crianças
cantando a nossa música. Eu acho que, se a gente conseguiu fazer isso,
já é uma coisa muito importante. (1989)
[ A gente é um pouco diferente das bandas daqui do Rio de Janeiro,
extremamente leves, hedonistas. A gente, não. Nós sempre fomos
contundentes, já chegamos falando contra o chauvinismo, contra o
sistema escolar, essas coisas. (1991)
[ A gente sempre quis ser a maior banda de rock do Brasil. (1994)
[ A gente começou com punk, era underground, de repente fez sucesso.
Então, a gente virou uma espécie de uma banda meio híbrida. A gente
faz uma porção de discos e eles não são iguais. Embora tenham sempre
aquelas baladas, o homem lá cantando, variam um pouco aqui, variam
um pouco ali. Hoje em dia, tem essa coisa mais compacta, uma linha
determinada. Os Titãs são um bom exemplo disso, porque, antigamente,
eles tinham um som supervariado e, hoje em dia, o estilo musical deles
está mais conciso. Então, fazem uma coisa assim mais parecida. Eu acho
que a gente, por ter um público muito grande, a gente tenta variar.
(1994)
Nunca seguimos uma moda. Não fazemos rock porque é moda. Pode
ser que tenha passado um momento, que foi o da descoberta pela
imprensa, de empatia e de grandes shows. Não me satisfaz. Interfere na
minha privacidade, em como me vejo como artista e cidadão. Também
não fazemos televisão, mas continuamos tocando. Pode ser que não
estejamos na lista dos dez primeiros, mas estamos entre os 20. Com
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vendas, é a mesma coisa. O rock é isso: atingir o coração das pessoas; não é anúncio de
iogurte. (1994)
[ A Legião chamou muita atenção, porque surgiu no período da abertura,
da redemocratização. Mas, basicamente, o que escrevemos são canções
de amor. (1995)
[ Passamos por todas as fases do rock'n'roll. Quebramos vários quartos
de hotel e, uma vez, chegamos a parar um avião, taxeando na pista, para
que nosso baixista [Renato Rocha] não o perdesse. (1995)
[ Se a gente mudar de som, muda de nome. Não vai ser mais Legião.
(1995)
'LEGIÃO URBANA' [o primeiro disco]
[ Em termos de vendagem, o disco chegou a 50 mil cópias, o que não
é muito. Mas, considerando o tipo de trabalho que a gente faz e o fato
de ter sido o primeiro disco, o resultado foi espetacular. Poderia ter
vendido muito mais, se a gente tivesse entrado no esquema um
pouquinho mais. A gente só aceitou fazer certos programas de televisão,
certos trabalhos de divulgação, porque a gente queria que as pessoas
nos vissem, nos ouvissem. Agora, a Legião não está vendendo camiseta
na Sears, entende? Não entrou nesse esquema, nisso que você precisa
para chegar a cem mil cópias, 200 mil cópias. Quase todas as faixas do
disco tocaram muito nas rádios de todo o Brasil, mas o rádio no Brasil é
uma coisa curiosa — executa muito as músicas, mas não chama as vendas.
(1986)
[ É curioso como esse primeiro disco não envelheceu, continua tocando
para caramba, até hoje. (1991)
LEITURAS
[ Ultimamente, eu não tenho lido muita ficção. Eu tenho lido biografias,
eu gosto muito de biografias. Bem, Shakespeare eu sempre leio. Mas,
virtualmente, eu leio qualquer coisa: histórias de feiticeiros, de terror,
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Stephen King eu adoro. Subliteratura mesmo. Adoro coisas bem horripilantes. Mas
também leio coisas sérias, para estudar a linguagem. Ultimamente, eu leio muito
Drummond. Eu amo o Drummondl Para mim, só existem dois: o Fernando Pessoa e o
Drummond. Prosa, eu não conheço. Eu gosto de acompanhar o trabalho do Caetano,
presto atenção na construção gramatical, na divisão de sílabas. Até pouco tempo atrás, eu
estava estudando sonetos, aí eu lia Camões e tentava fazer os meus. Ih, que bobo que eu
sou, tão pedante... (1986)
[ Ando lendo coisas tipo não-ficção. Por exemplo, fatos que mudaram
o mundo e coisas assim. Recentemente, eu consegui as obras completas
do Allen Ginsberg. Sempre estou lendo poesias, principalmente os
poetas ingleses, que eu gosto mais do que os norte-americanos. No
momento, mesmo, eu não tenho lido bastante, porque estou fazendo
umas letras e não quero me influenciar. (1988)
[ Fernando Pessoa, William Burroughs... Teve uma época em que li
muito Thomas Mann... Mas, espera aí! Isto pode parecer que eu sou
pedante, citando esse pessoal. Eu não fico trancado em casa lendo Mann,
não é só isso. (1988)
[ As melhores coisas que eu li, ultimamente, são todas de autores gays.
O pessoal mais venenoso chama os heteros de breeders [reprodutores]...
Não têm sensibilidade, são uns babacas e tal. Mas não é verdade. Há
pessoas heterossexuais maravilhosas, assim como há gays fascistas. É o
caso do próprio McCarthy [senador americano que, no começo dos anos
50, liderou a caça às bruxas aos comunistas e simpatizantes no meio
artístico]. (1990)
LENNY KRAVITZ
[ Há coisas de que realmente eu não gosto. Por exemplo, todo mundo
adora o Lenny Kravitz, e eu acho o Lenny Kravitz um fake de marca
maior. (1992)
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LETRISTA
[ Embora as letras sejam importantes, elas são um meio, e não um fim.
(1987)
[ Eu me considero um letrista, e não um poeta. Tenho uma certa
preocupação com o que eu escrevo, é lógico. Sempre gostei da palavra,
fui um bom aluno em Literatura e Gramática. (1988)
[ Ah, falta muito para eu ser um grande letrista. Mas têm algumas
coisas de que eu gosto muito, tipo Andrea Doria. (1988)
[ No momento em que escrevi as letras e descobri que poderia também
trabalhar rimas ricas, fui tentando aprimorar. Eu. pessoalmente, vou
tentar não rimar verbo no intransitivo com verbo no transitivo. Vou
tentar fazer algo bom, porque vou ficar mais satisfeito e o trabalho será
mais duradouro se tiver qualidade. (1988)
[ A palavra é importante, mas a sonoridade tem a cara e o jeito da
gente. Nós filtramos o verbo e a música pelo lado emocional. Depois,
eu sempre escrevo as letras depois das músicas prontas; por isso, não só
as letras causam impacto. (1989)
[ As pessoas realmente não analisam as letras. Mas eu gosto de acreditar
que faço de uma tal maneira que possam ser interpretadas de várias
formas. (1991)
[ Todo mundo reclamou que as letras de O Descobrimento do Brasil
são infantis. Ora, bolas1. Eu disse que as letras seriam simples porque eu
quero que o meu filho, os do Bonfá e do Dado entendam. Me
perguntaram se eu estou com Aids, mas não me perguntam por que
escrevi uma letra de determinado jeito. Nunca, nunca, nunca. (1994)
[ Eu sempre escrevo para mim. Se estou satisfeito, está ótimo. Aí,
depois, eu mostro para a banda e para os meus amigos. Aí, eles dão
palpite: "Aqui você pisou"... Tinha uma música chamada Rapazes
católicos, que a gente cortou de As Quatro Estações porque era
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impublicável. É impublicável... Era muito explícita, sexualmente. Em geral, as pessoas
falam: "Você escreve tão bem! Você pode falar isso sem usar essas expressões". Eu
falei: "É mesmo". (1994)
LIBERDADE
[ Acho que a liberdade é uma das grandes questões dos anos 90. A
única liberdade que sobrou é a emocional, psíquica. Não quero nunca
que me controlem. O ser humano é mamífero, totalmente sexual. Se
você reprime isso... Essa bobagem: se John Lennon era ou não era gay.
E se fosse? Parece que o cara vira um assassino. Aliás, olha que coisa
curiosa: se um ator faz o papel de um assassino, ninguém vai achar que
ele é um assassino. Agora, se um ator faz papel de gay, todo mundo vai
achar que ele é. Tem alguma coisa errada. Isso me interessa
profundamente. A humanidade é desumana, mas acho que ainda temos
uma chance. (1990)
[ Por que eu não posso ter liberdade de abrir o peito e cantar "é o
amooooooooooor...? (1995)
LÍDER
[ Ser tratado como líder me incomoda muito. No final da excursão do
disco Dois, o clima já estava insuportável. Tanto que paramos para dar
um tempo. Mas sempre fiz questão de colocar para as pessoas que eu
não era, de maneira nenhuma, o dono da verdade. (1988)
LIMPO
[ Eu não volto atrás. Eu não repetiria nada, mas eu também não me
arrependo. Eu acho que cada pessoa cresce como tem que crescer. Eu
dou graças ao poder superior que eu encontrei um caminho, mas é só
por hoje — amanhã, eu posso estar aí, caído no chão, levando porrada
de segurança, porque eu estou bêbado de novo. É só por hoje, mas só
por hoje eu estou limpo, e é legal à beça. (1993)
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LÍNGUA ESPANHOLA
[ Eu não me identifico com a língua espanhola. É belíssima, mas não
me identifico. Se for para cantar em espanhol, canto em português.
Acho muito parecido. Italiano é completamente diferente. (1995)
LÍNGUA PORTUGUESA
[ Que língua portuguesa? Cadê nossas escolas? A língua portuguesa é
muito bonita, mas é difícil. Dá muito menos trabalho escrever em inglês,
que tem certos fonemas, e a divisão das sílabas... quando há sílabas!
Porque o inglês é uma língua virtualmente monossilábica. Sério, é melhor
fazer música em inglês do que uma música em português que diz "mulher
é tudo vaca". Aí é o meu limite. Isso não dá. (1992)
[ A língua portuguesa é belíssima. Mais doce que o italiano. (1993)
LITERATURA INGLESA
[ Mesmo os escritores ingleses mais experimentais são muito mais fáceis
de entender, com algumas exceções, como o Joyce — mas ele era um
inventor de palavras. Não é como o Modernismo brasileiro, ou os
experimentalismos de língua latina, que geralmente são muito difíceis.
É uma questão de simplicidade. Aí você pensa na literatura dos beats
para cá. Eu não tenho lido nenhum escritor contemporâneo diante de
quem eu possa chegar e: ah! O que acontece com a poesia inglesa é que
ela é muito ligada à tradição da canção. Uma coisa que me atrai muito
neste ponto é o cancioneiro elisabetano. (1988)
LIVRO DE CABECEIRA
[ Tao Te-king. Explica o caminho perfeito. (1994)
LIVROS
[ Zen e a arte da manutenção das motocicletas, de Robert Pirsig, e O discurso
da servidão voluntária, de Etienne de La Boetie. (1994)
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LOBÃO
[ O Lobão sabe manipular muito bem a questão das drogas. Se ele não soubesse, já teria
morrido. (1988)
LONDRES
[ Eu achei que seria um ótimo momento para o Dado e o Bonfá irem
para Londres [participarem da remasterização dos discos da Legião].
Somos uma banda] Por que é que eu tenho que fazer tudo? Eu estou
cansando] Quando eu quiser ir para Londres, eu vou para Londres. Pô,
com esse disco novo da Legião, eu não quero nem saber] A gente vai
para lá] Eu também quero ficar em hotel, eu também quero conhecer
Peter Mew e todo mundo [do estúdio Abbey Road]. Porque isso já era
para ter rolado há mais tempo. Eu quero ir lá] Imagina] Eu quero ir para
Londres] Conhecer, ver as coisas... Eu acho que, em Londres, eu até
andaria de metrô. Uma ou duas vezes, talvez. É bacana andar de metrô
e tal, mas eu gosto de andar de táxi para ir vendo a cidade. (1995)
'LONGE DO MEU LADO' [faixa do disco A Tempestade — Ou O
Livro dos Dias]
[ Ah, a sacarina do Bonfá [Ah, essas músicas que o Bonfá me manda]
Aí, todo mundo acha que eu é que faço essas músicas, e que eu é que
sou o melancólico do grupo] Eu tenho essa fama. Isso vem mais das
letras. As minhas coisas são as coisinhas mais pop, mais bundas, mais
pretensiosas e mais metidas a besta. O Bonfá é quem faz Vento no litoral.
Mas é preciso... Esta música é você utilizar o meio mais romântico para
dizer "Eu não quero estar apaixonado". Sabe, são certas sutilezas. Esse
cara está é louco, está se perdendo de paixão. Aí as pessoas pensam que
isso sou eu, entendeu? (1996)
'LOVE IN THE AFTERNOON' [faixa do disco O Descobrimento do Brasil ]
[ Esta música foi feita para o Luís, um amigo. A gente chegou a namorar
um tempo. Ele morreu baleado por uns sujeitos estranhos, na saída de
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uma boate em Campo Grande, onde costumava ir. Isso é uma coisa terrível. (1993)
[ É uma música que foi feita para diversas pessoas e, quando o Kurt
Cobain morreu, a gente pensou assim: "Poxa, mas se encaixa direitinho".
Na verdade, esta música foi feita para todas as pessoas que vão embora
cedo demais. (1994)
LUGAR ESQUISITO ONDE FEZ AMOR
[ Embaixo do telhado, no vão da caixa d'água. O melhor lugar é aonde
a gente se sinta seguro. (1994)
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
[ Eu gosto do Lula, mas todo mundo fala muito mal dele. Meus amigos
dizem que é bronco e vai afundar o país. Mesmo assim, tenho uma
enorme simpatia. E, toda vez que leio o Paulo Francis, sinto mais vontade
devotar no PT. (1994)
Nessas eleições, o Lula pisou na bola. Autoconfiança demais. Ouvi
coisas horrorosas do Lula e do Fernando Henrique. Tentei sair pelas
pessoas. Quem vai votar em Lula e em Fernando Henrique? Por esse
lado, fui mais para o Lula. Todas as pessoas que eu achava inteligentes,
bem informadas e de sensibilidade falavam que iam votar nele. (1994)
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