quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

GATO ESCALDADO TEM MEDO DE ÁGUA FRIA

O presidente Lula parece ainda não ter perdido a esperança de se livrar do incômodo de ter o senador maranhense Edison Lobão como um de seus ministros.

primeiro Lula adiou por quase duas semanas o anúncio, ontem(quarta-feira), após se reunir com Lobão e confirmar sua ida para a pasta de minas e energia o petista resolveu postergar sua posse para a próxima segunda-feira, sem que haja para isso um motivo que justifique tal adiamento.

A cada dia pipoca uma denúncia nova contra Edinho, filho e primeiro suplente de Lobão no senado federal e provavelmente por conta disso o presidente Lula esteja tão reticente e na espectativa para ver até onde vai essa história.

Lula que só nomeou Lobão para a pasta por pressão do senador José Sarney, pois preferia alguém com qualificação para o cargo, agora teme pelo futuro do seu governo que já protagonizou uma série de escândalos desde seu primeiro mandato.

Um comentário:

Anônimo disse...

Marco Antonio Villa: Sarney é um "cacique exitoso"

Sexta, 18 de janeiro de 2008, 09h02


Claudio Leal

Antônio Cruz/Agência Brasil

O senador José Sarney (PMDB-AP) conversa com a filha, a senadora Roseana Sarney (PMDB-MA)






A nomeação do senador Edison Lobão (PMDB-MA) para o ministério de Minas e Energia, em meio às denúncias contra seu filho (acusado de usar laranjas em uma empresa para driblar dívidas fiscais), realçou o poder do senador José Sarney (PMDB-MA) nos bastidores da política brasileira.
Eleito deputado federal em 1965, governador do Maranhão entre 1966 e 1971 e presidente da República (1985-1990) na redemocratização do País, Sarney consolida, quase sempre de forma discreta, uma das mais longevas presenças políticas da República.

Em entrevista a Terra Magazine, o historiador Marco Antonio Villa, professor do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos, analisa a trajetória de Sarney e defende que uma das características de sua força política - regional e nacionalmente - é jogo minimalista travado pelo poder local com o central.

- Ele consegue vender, se relacionar bem, tem essa forte presença nacional de décadas. Sarney é hoje o cacique mais exitoso da política brasileira, em termos de longevidade - afirma.

Villa é polemista de gume afiado. Autor de "Jango, um Perfil (1945-1964)" e "Vida e Morte no Sertão", pesquisador da história do Império e da República, ele sustenta uma crítica permanente às influências do coronelismo na esfera federal. Em 2005, escreveu um polêmico artigo, na Folha de S. Paulo, sobre José Sarney e o atraso social do Maranhão. Ganhou uma carta-resposta irada do filho do senador, Sarney Filho. Villa faz uma ressalva:

- ...(Sarney) vende um apoio maior do que ele tem. Me lembra um pouco o Evo Morales: vende o gado, mas não tem o gado. Ele vende uma influência que é muito superior à que tem no Congresso.

O historiador analisa com ironia a indicação do novo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.

- Parece que o Sarney tem uma vocação pro setor elétrico. Ele sabe, no máximo, como nós, acender e apagar o interruptor (risos).

Adiante, confessa dois desejos, dirigidos ao ex-presidente e à sua filha, Roseana Sarney, líder do governo no Congresso.

Primeiro: - Eu gostaria que alguém chegasse pro Sarney e perguntasse por que ele tem tanto interesse no setor elétrico, se ele gostaria de ter sido engenheiro elétrico...

Segundo: - Eu até brinco: não consegui em 2007 ver, mas em 2008 meu sonho de consumo político é vê-la (Roseana) falar no plenário ou num debate. Até hoje, nunca vi - e assisto a TV Senado. Eu nunca a vi participar de um debate político!

Para Villa, a relação entre José Sarney e o presidente Lula guarda pragmatismo de ambos os lados. Lula atenuou a imagem negativa entre os conservadores; Sarney reformulou a aliança nacional para controlar o poder local, ainda que seu grupo tenha perdido o governo do Maranhão.

A seguir, a íntegra da entrevista do historiador Marco Antonio Villa.

Terra Magazine - O senador José Sarney acaba de emplacar um afilhado político no Ministério de Minas e Energia, o senador Edison Lobão (PMDB-MA). O senhor já tinha escrito um artigo polêmico sobre Sarney, na Folha de S.Paulo, em 2005. Mas como explicar, hoje, essa longevidade política?
Marco Antonio Villa - Você falou naquele artigo (A crise política e o coronelismo)... Lá no Maranhão deu uma confusão! Bem, o filho (Sarney Filho) me xingou numa carta à Folha, a TV Mirante... Tenho um amigo, velho amigo do tempo do movimento estudantil que mora lá: "Olha, você não sabe o que o pessoal da Mirante tá falando aqui de você." E eu nunca fui pra lá. Aí me convidaram, justamente o pessoal que faz oposição a Roseana, pra falar. Eu disse: "Tudo bem". Discutir questões gerais... Foi impossível achar um lugar. Quando acharam, os bombeiros interditaram! (risos)

Me liga um amigo: "Estamos com problema, não temos um local...". Eu disse: "Deixa pra lá, não quero arrumar um transtorno aí pra vocês". Os bombeiros identificaram um problema de incêndio...(risos) Acho que era o auditório da OAB, em São Luís. Descobriram que ele tinha problemas estruturais justamente quando eu ia falar. Mas os caras são realmente senhores da vida e da morte dos maranhenses, apesar de terem perdido as eleições, apesar de o Fernando (Sarney) correr o risco de sofrer agora um processo por causa do saque de R$ 2 milhões antes das eleições (de 2006). Mas eles só têm o poder no Maranhão porque têm o poder em Brasília. Quer dizer, o senhor local tem influência porque ele tem um pé no poder central. É o poder nacional que dá base pra ele ter o poder local.

Consolidou esse poder quando se tornou presidente da República?
Consolidou. Apesar de ele construir esse poder local desde a primeira gestão dele como governador, em 1965. Depois como senador, presidente da Arena. E ele construiu um império econômico. Porque o coronel local precisa ter influência política, mas também o poder econômico. Esse poder não é construído só pela área do comércio ou da agricultura, já que a indústria inexiste na região, mas precisa da mídia, é essencial. Aí a rádio, o jornal e a TV, especialmente a TV, são essenciais pra manter essa influência política local. E ele é retransmissor da Globo.

Um processo semelhante ao de Antonio Carlos Magalhães na Bahia?
O Antonio Carlos aproveitou o governo Sarney pra transferir a Globo pra TV dele, a TV Bahia. Foi fundamental pra consolidar o poder da família Magalhães. O Sarney aproveitou os 5 anos de presidência pra ter influência não somente no Maranhão, mas nos Estados vizinhos - no Piauí e, depois, em 1990, quando saiu candidato pelo Amapá.

Algo que o Assis Chateaubriand (fundador dos Diários Associados e ex-embaixador em Londres) já tinha feito.
Bem lembrado. Já tinha feito. E o próprio Ermírio de Moraes, lá atrás, quando saiu candidato ao Senado por Pernambuco, em 1962, pelo PTB. O pai do Antonio Ermírio. E ele (Sarney) sai pelo Amapá, até porque temia a possibilidade de ter processos, supostamente feitos pelo Collor, naquela história de "Caçador de Marajás". Mas no fim acabou não acontecendo nada.

A trajetória de Sarney não é diferente de ACM? Porque ele é discreto, esquivo a entrevistas, é literato...
Ah, isso... Nesse sentido, ele é o oposto de Antonio Carlos. Ele nunca põe a cara pra bater. Ele sempre evita o enfrentamento. E historicamente foi assim, não é só agora. Ele faz uma conexão muito boa com a área cultural, mas sendo agente cultural também. Supostamente como escritor, literato e tal... O Antonio Carlos fazia uma ponte com a cultura, mas ele não produzia...

Era o padrinho?
O padrinho.

E o que faz Sarney para se adaptar melhor ao governo Lula do que aos anteriores? Ele acaba de indicar o Lobão, no governo do partido que lhe fez oposição ferrenha.
Você vê que é uma coisa curiosa. No governo Fernando Henrique, ele não tinha o poder que tem no governo Lula. Curioso isso. Agora, eu acho que isso aí é uma questão de estratégia local. Ele percebeu que pra manter o poder em 2002, era preciso dar uma guinada nas alianças nacionais. Daí a busca, já na campanha presidencial de 2002, de se aproximar da candidatura do Lula. Evidentemente, só foi possível fazer essa aproximação porque já havia uma simpatia do Lula para com o Sarney. Ou seja, ele precisava buscar apoios tradicionais pra eliminar aquelas barreiras em relação a sua figura. Aí ele fez a ponte com José de Alencar para vice, fez com Sarney e outros líderes locais.

Mas o caso de Sarney é o mais representativo, pela importância histórica que o Sarney tem. Ele precisava estabelecer outras alianças no plano nacional. E sabia que a candidatura Lula no Maranhão era forte, por causa da representação simbólica de Lula em 2002. Nesse conjunto de interesses recíprocos, Lula-Sarney, Sarney-Lula, é que ele estabeleceu essa sólida aliança que o Lula faz questão de ressaltar a todo momento - com a presença de Sarney, inclusive, na campanha de 2006, abandonando o Jackson Lago (PDT-MA)...

Um aliado do PT e de Lula.
Lula apoiou a Roseana, fazendo questão de ir durante a campanha presidencial ao Maranhão. E fez questão de se penitenciar, quando inaugurou a ferrovia Norte-Sul, das críticas que fez à ferrovia, dizendo que quem estava certo era o Sarney...

Houve denúncias de licitações viciadas, feitas pelo jornalista Jânio de Freitas, em 1987.
Perfeito, o Jânio de Freitas fez com antecedência. Quer dizer, como se não soubéssemos de tudo aquilo. O Lula sempre jogou muito pesado nesse tipo de aliança, apostando que, com o Sarney, ele abriria a relação com o empresariado mais conservador. Teve que ceder uma fatia do poder federal pro Sarney. Inicialmente, até foi na parte de verbas, mas depois foi cedendo a Eletrobrás, parte do setor elétrico... Parece que o Sarney tem uma vocação pro setor elétrico. Ele sabe, no máximo, como nós, acender e apagar o interruptor (risos) Mas ele tem um naco importante e foi ampliando sua influência, especialmente nas agências que atuavam na área do governo federal, e dando apoio no Congresso. Só que ele vende um apoio maior do que ele tem. Me lembra um pouco o Evo Morales: vende o gado, mas não tem o gado. Ele vende uma influência que é muito superior à que tem no Congresso.

Menor com a perda do governo do Maranhão?
E perdeu o governo do Estado em 2006. Agora, sua filha é líder do governo no Congresso Nacional. Eu até brinco: não consegui em 2007 ver, mas em 2008 meu sonho de consumo político é vê-la falar no plenário ou num debate. Até hoje, nunca vi - e assisto a TV Senado. Eu nunca a vi participar de um debate político!

Uma característica do pai, não?
Isso, isso. É interessante porque a filha, como maior herdeira, não participa dos debates, dos embates. Busca fazer articulação nos bastidores. E vende pra elite política que é uma grande articuladora de bastidores, o que não é verdade, basta ver a derrota do governo na votação da CPMF no Senado. Mas vende muito essa idéia. O presidente Lula, não só ele, outros presidentes também tiveram dificuldade de trabalhar com os coronéis no Congresso, teme sempre o enfrentamento com o coronel. Como se enfrentar o coronel seria colocar em risco a governabilidade.

Mesmo com um partido como o PMDB, em retalhos?
Você pode enfrentar e contemplar outro setor do partido. Porque, afinal, o PMDB é uma federação de caciques, né? E o Sarney tem influência relativa sobre o partido. Porque há vários setores do partido que não se dão bem com Sarney. Várias seções estaduais têm verdadeira ojeriza a Sarney. Então, ele consegue vender, se relacionar bem, tem essa forte presença nacional de décadas. Sarney é hoje o cacique mais exitoso da política brasileira, em termos de longevidade.

Hoje, ele não está retocando a biografia?
Mas pensando sempre na permanência dos interesses da família. Ele busca vender a idéia de uma reserva moral da Nação. É essa idéia que ele vende através da Folha, às sextas-feiras. Nos artigos da sexta-feira, a impressão que ele dá é de que está em outro País, não está no Brasil. Como se ele não fosse um agente político, como se ele pairasse, a luta política fosse uma coisa rasteira, muito abaixo do que ele representa pro País...

Como se fosse, nacionalmente, um Ruy Barbosa?
É, agora alguns temem o enfrentamento. Eu gostaria que alguém chegasse pro Sarney e perguntasse por que ele tem tanto interesse no setor elétrico, se ele gostaria de ter sido engenheiro elétrico. Pode ser que ele quisesse ser engenheiro elétrico e por alguma razão seu pai o dirigiu à advocacia, e ele ficou frustrado, etc. e tal. Eu presumo que seja isso. Mas, ao mesmo tempo que ele pensa essa perpetuação da biografia, pensa em manter o interesse da família. Quando ele vem a São Paulo, almoça no Massimo. Mas ele janta com um coronel em Codó, lá no Maranhão. O contato com o Massimo não substitui o contato com o coronel de Codó. E vice-versa. Ele estabelece essa graduação. Tem muita influência porque lá é a cidade da bruxaria, ele tem lá os bruxos que o assessoram, essas coisas bem Latinoamérica...

Uns toques de misticismo.
O realismo mágico nosso não é na literatura, é na política. Ele só sobrevive porque nós temos um baixíssimo nível de debate político. Se tivéssemos um debate político efetivo no Brasil, e se a transição da ditadura pra democracia tivesse sido realizada da forma mais rápida e mais radical, como foi feita em Portugal e na Espanha, o Sarney certamente não teria o poder que tem hoje. Mas nós tivemos uma transição em que quem deu as cartas foram os setores atrasados, especialmente a elite nordestina, em que São Paulo perdeu o protagonismo, acabou Sarney tendo esse poder. Se tivéssemos um debate efetivo, certamente Sarney não teria o poder que tem. Por exemplo, se perguntassem a Sarney ou a seus asseclas o que foi o governo Sarney. Um governo que entregou a seu sucessor uma inflação de 90% ao mês. Março de 90 teve a segunda maior inflação da história do mundo. Antes foi com a Hungria, e depois nós.