'I GET ALONG WITHOUT YOU VERY WELL' [do disco The Stonewall
Celebration Concert, composta por Hoagy Carmichael]
[ Esta música fala daquela sensação dos meses que se transformam em anos. Você
acorda de manhã, todo dia, respira fundo e diz: "Tudo bem, eu estou indo muito bem
sem você, eu estou bem"... (1994)
IDENTIDADE SEXUAL
[ As pessoas não são liberadas. A gente está na Idade Média. Imagina,
o Brasil é o país mais racista do mundo! Liberdade sexual são essas drag
queens. Eu acho que o que falta, hoje em dia, é respeito. Agora, isso é
uma coisa que ainda vai levar muito, muito tempo. Um país que não
tem um sistema social, onde o Estado não funciona, não existem escola,
uma rede de transporte decente, não existe informação... É isso que a
gente tem que trabalhar antes. A questão da identidade sexual, isso
vem depois. É uma coisa que vai ser conquistada. (1994)
[ Ter uma identidade gay, para mim, é uma questão política. Uma vez,
eu fui com um namorado numa festa gay e — é gozado —, apesar de
estar namorando comigo, ele não tinha essa identidade. Ele chegava
para mim, dizendo: "Nossa, Renato, quanto viado!". Eu fiquei dando
risada, porque ele não se achava gay, nem nada. (1996)
IDENTIFICAÇÃO
[ Eu gostaria que a coisa mais importante fosse aquilo que as pessoas
escrevem nas cartas para a gente: "Vocês são legais porque são que nem
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a gente". Bom, eu acho que isso é uma romantização... Essa é a imagem da Legião, mas
as pessoas percebem que nós somos quatro amigos que fazem música. (1987)
[ Nós somos iguais aos jovens que ouvem a gente: sensíveis, inteligentes,
rebeldes, de saco cheio. (1988)
[ Eu gosto de acreditar que as pessoas compram nossos discos porque
sentem e percebem que eu sinto e percebo exatamente aquilo que elas
sentem e percebem. Se a Legião tiver uma força, é a de ser igual ao
público. (1988)
[ A única coisa que eu sei é o seguinte: as pessoas acompanham o que
a gente faz não porque mostramos uma grande novidade — porque o
rock não é nem um pouco original —, e sim porque o que nós fazemos
já estava dentro delas. Então, um garoto compra um disco da Legião —
dos Titãs, do Lobão, ou de quem quer que seja — e, antes de ir para o
colégio, ele vai ouvir aquela música, vai pensar na vida, no país, no
governo, na situação caótica, em ecologia, em crimes, medos, angústias,
felicidade. É legal você ter uma trilha sonora. (1989)
[ Eu acho que, ao longo do tempo, as pessoas foram incorporando, e é
como se as nossas canções fossem amigas, é como se fossem pessoas
que elas conhecem. Eu acredito que o fã, quando chega em casa e está
triste, ouve talvez Andrea Doria, ou Por enquanto; se está alegre, coloca
Eduardo e Mônica. Então, isso entra no universo da pessoa. E, no caso
de as letras serem sempre sobre emoções interiores — a gente tem
muitas canções de amor, e é tudo na primeira pessoa —, a pessoa, quando
canta, é ela que está cantando aquilo. Aquelas palavras passam a ser
dela. (1990)
[ Não tem explicação. Existe uma espécie de mágica, que faz o público
nos adorar. Nosso som é primitivo, nossa música é simples, não dá para
entender como vendemos tanto. Nós conseguimos uma coisa, que a
MPB também tinha, que é uma identificação com o público universitário.
(1991)
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[ Como eu faço as letras sempre em primeira pessoa, há uma identidade,
paradoxal, entre a música e o ouvinte. "Poxa, esse cara está falando da
minha vida!.". Já teve um cara que até quis me bater] Eu estava andando
no Shopping da Gávea, chega esse cara e diz: "Você não tinha o direito
de escrever Ainda é cedo sobre a minha história, de ficar espalhando
isso para as pessoas! Como é que você sabia de tudo?". E me olhando,
com aquela cara de psicótico... Pô, cara, eu estava falando de mim! Eu
sempre gostei de Bob Dylan, desse tipo de compositor que, mesmo
quando está falando do social, do que quer que seja, passa isso por um
prisma psicológico-afetivo-emocional-íntimo, sei lá... (1992)
[ Não é uma questão de entender ou não, é uma questão de se
identificar, e eu acho que todo fã da Legião se identifica. Porque, senão,
eles não cantariam as nossas músicas, não teriam o carinho que têm
pela gente. (1995)
'IF TOMORROW NEVER COMES' [faixa do disco The Stonewall Celebration
Concert, composta por K. Blazy e G. Brooks]
[ É aquela tal história: eu tenho paranóia de não dizer para uma pessoa o que eu sinto
por ela, e essa pessoa, por algum motivo, sair da minha vida. Então, eu sempre falo.
Quando eu gosto da pessoa, eu chego e falo assim: "Olha, eu gosto de você para
caramba". Mas é muito difícil você falar isso. Às vezes, é muito difícil. (1994)
ILHA DO GOVERNADOR [bairro onde morou no Rio, antes de mudar-se para
Ipanema]
[ Parece uma rua da Gávea; têm até guarita, crianças brincando. A
garotada é legal, você sabe quem mora ao lado. O ruim é ser longe. Às
vezes, é uma vantagem. Quando as pessoas te chamam para ir num
lugar e você não está a fim, é só dizer: "Não dá, eu moro longe para
caramba". (1987)
[ É a casa onde passei a minha infância, isto me dá uma super segurança.
A mesma rua, as mesmas árvores, é muito bom. Mas já estou me
sentindo seguro, já posso enfrentar a cidade grande. Eu não gostava
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muito da idéia de morar sozinho na Zona Sul — iria tomar porre todas as noites. Essa
coisa de você morar sozinho na metrópole é muito perigosa. Na Ilha, não tenho só os
meus avós, mas também os meus primos, os meus amigos de infância. É uma questão de
ambiente. E, na verdade, eu fico mesmo é trancado em casa. (1988)
IMAGEM
[ A imagem é importante. É que nem o Donny, do New Kids. Ele tinha
que ser alguma coisa, já que é o mais feioso. Então, ele tem que ser o
rebelde, o que fala as coisas. (1992)
[ Tenho esta imagem de pessoa pesada, carregada, mas quem me
conhece diz: "Ah, você é tão legal". Nunca me esqueço da minha mãe
dizendo: "Meu filho, o Cazuza é tão educado1.". Porque, afinal, somos
um bando de meninos de classe média. (1996)
IMIGRAÇÃO ITALIANA
[ Acho que deve se valorizar, e muito, essa gente que saiu há anos —
50, 100 ou até 150 anos — de um país, para chegar numa terra
completamente estranha apenas com as botas e a vontade de trabalhar.
Na verdade, eles trouxeram na bagagem uma nova civilização, com toda
uma cultura, a experiência e o sofrimento da guerra. Enfim, nós,
brasileiros, aprendemos muita coisa com os imigrantes italianos. (1995)
IMORTAL
[ Vou escrever um livro quando chegar aos 50 anos. No fundo, quero
ser imortal. (1996)
IMPASSE
[ Os anos 80 são esse liqüidificador, justamente, para mostrar que
você pode usar o entretenimento e, dentro do aspecto de massa, fazer
uma coisa que vai ser considerada arte. Por exemplo, os Beatles nunca
foram lá de fazer coisas muito profundas, existenciais. Eu acho que
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você pode fazer uma coisa divertida, para cima, e ser uma coisa que vai ter o seu valor. O
que pinta muito no aspecto da crítica, no Brasil, é justamente que eles se apegam muito
a essa coisa do triste, do Sartre, dessas coisas existencialistas, do pessimismo ia coisa
dark. Claro, se você está angustiado, se você está sozinho, numa superparanóia e
esquizofrenia e, se você tiver um pouco de talento, vai sair uma coisa belíssima. Mas,
espera aí! Você também pode usar o seu lado positivo para fazer uma coisa legal. O
nosso impasse é justamente este: fazer uma coisa honesta e sincera e que seja para
cima, para dar uma força para as pessoas. Porque, também, se você faz uma coisa que
é para cima, as pessoas não vão levar você a sério. Nesse caso, elas exigem que você parta
ou para a sátira, ou para a ironia, ou para o humor. (1985)
[ Se a gente está tentando, está tentando de bobo. A gente entrou
nesse trem de bobo. A gente pegou esse trem achando que ia para a
Disneylândia e depois, ele foi para Auschwitz. Porque eu nunca saí da
minha casa para cantar rock'n'roll, para estar falando essas coisas aqui.
Nunca. Eu queria era sexo, drogas e rock'n'roll. OK, estamos num
impasse. Não adianta mais fingir. (1988)
[ Acho que, realmente, chegamos a um impasse em termos de estética.
Dá para perceber isso principalmente, no exterior. Aí, fico preocupado:
será que o que estou fazendo já morreu? Isso mexe com a minha cabeça.
(1989)
IMPOSTOS
[ Alguém deveria apresentar um projeto para que, junto com o preço
de tudo, viesse escrito quanto se paga de imposto. É como se faz nos
Estados Unidos. Você fica sabendo quanto dinheiro vai para onde. Eu
pago muito, muito imposto. Para onde vai tanto dinheiro? Somos a
segunda geração que está vivendo pior do que os pais. E muito chato ser
formado, trabalhar, e não poder dar uma festa de aniversário por falta
de dinheiro. Sou classe média, sou suburbano. Meu apartamento é a
única coisa que eu tenho. O que dá dinheiro é fazer shows, que eu não
gosto. (1994)
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INCÔMODO
[ Minha saúde. Foram 15 anos de droga-adicção. (1994)
INCOMPREENSÃO
[ Assumo que bebo: se eu não tiver uma ou duas doses, não saio de
casa, nem subo num palco. Sou muito tímido. No entanto, sinto uma
grande incompreensão em relação à minha pessoa. Também sou generoso
e sensível, e só querem explorar um lado decadente. (1993)
'ÍNDIOS' [faixa do disco Dois]
[ A letra de Índios eu escrevi no estúdio, assim! Música tão linda! Têm
coisas bem fortes ali... E eu mostrava para o grupo, e eles: "Legal, Renato".
E meu coração ali! Foi uma coisa muito difícil. Eu queria uma resposta,
e ela não vinha. (1988)
[ Em vez de eu falar o que é amor, eu digo: "Quem me dera ao menos
uma vez/Esquecer que acreditei que era por brincadeira/Que se cortava
sempre um pano de chão/De linha nobre e pura seda". Ora, tem gente
que não vai querer ouvir isso. Tem gente que quer ouvir solidão que
rima com paixão, e amor com dor. (1988)
[ Essa é a música mais difícil de todas. Eu nunca sei a letra dessa música,
e a gente nunca sabe tocar. Mas a gente acha que é uma música especial.
(1992)
INDIVIDUALIDADE
[ Eu ouço o que eu gosto de ouvir, eu não tenho que ouvir o que as
outras pessoas estão ouvindo. Cadê a minha individualidade? Eu sou
um animal racional, sou único, não estou preso a ninguém, não sou um
bicho de três cabeças. Aí, o pessoal fica puto! Justamente esse mesmo
pessoal que agora fica dançando Dead Kennedys e B-52's nas festas e
pichando Caetano, Chico e Milton! Mas, espere aí, cadê o teu poder de
raciocinar? Por que Chico é ruim agora e antes não era? (1985)
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INFÂNCIA
[ Quando era moleque, brincava de pique, soltava pipa, andava de
rolimã, ia nadar na praia. (1995)
INFLUÊNCIAS
[ Para mim, depois dos Beatles, vinha Emerson, Lake & Palmer. Depois
que acabaram todas as grandes bandas, eu desisti. Aí descobri o Dylan,
e desencavei todos os seus discos e passei a ouvir muito folk, Byrds, até
chegar o punk. Oba! Descobri uma razão para viver. Aí vieram Siouxsie
& The Banshees, The Cure, PIL. (1986)
[ A gente tem muita influência dos 60, mas não acredito que o fato de
ouvir coisas como Martha & The Vandellas, Beach Boys, Gary Lewis &
The Playboys e Paul Revre & The Raiders nos influencie na hora de
compor. Pode até aparecer nos arranjos e na mixagem, mas não na
composição. (1989)
[ Há certas coisas que escrevo que aconteceram realmente comigo;
outras, com amigos. Mas, a partir do momento em que o negócio fica
pronto, é como se fosse meu alter ego. Até uma música nossa ficar
pronta, já entraram tantas influências! Mesmo Acrilac on canvas, que é
algo especificamente sobre uma experiência minha, não é alguma coisa
literal, porque, a partir do instante em que você passa para o papel,
você inventa. (1989)
[ Minha formação se deu ouvindo rock'n'roll. Mais recentemente, discos
como Clube da Esquina 2, de Milton Nascimento, e Amor de índio, de
Beto Guedes. E todos os bons poetas, como Fernando Pessoa,
Drummond... Mas é bobagem citar isso como influência. Eu leio e gosto;
mas, na hora, o que vale é a música. (1989)
[ Minhas influências são brasileiras; muito, muito mineiro. Beto Guedes
e Milton, mais até do que Caetano. Comprei muito Egberto Gismonti...
Até Ronnie Von — tem um disco dele que é tão bonito, eu vi num sebo
outro dia e quase comprei. Mas acabei desistindo de comprar, para não
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me decepcionar. É um que tinha a música que ele fez para a filha dele. Mas era legal!
Mutantes, Rita Lee — ouvi até cansar aquele Fruto Proibido. Chico, não é? Porque
Chico era o comunista que toda mãe queria ter como filho. Meu pai comprou
Construção. Ele ouvia Angela Maria, e minha mãe, umas coisas mais antigas. (1995)
[ A Legião Urbana foi comparada, na ordem, com U2, The Smiths,
The Cure, REM, e ainda teve, aí pelo meio, um Simple Minds — que
eu detesto. Ninguém disse que nossa influência maior foi de uma banda
chamada Beatles. Ou, então, Mamas and Papas, ou Bob Dylan. No Brasil,
as pessoas não têm curiosidade pela informação. Não houve uma pessoa
capaz de dizer que o que Raimundos, Chico Science e Jorge Cabeleira
fazem é o que a Legião Urbana fez com Faroeste caboclo. Como também, naquela época,
ninguém disse que Faroeste caboclo o Gil já tinha feito, com Domingo no parque. (1996)
INGÊNUO
[ Eu acho que seria tão legal se as pessoas começassem realmente a se curtir! É uma
coisa de que eu nunca desisto. As pessoas dizem que eu sou ingênuo, mas não consigo
desistir. (1985)
INGLÊS
[ Hoje em dia, todas as bandas que estão começando cantam em inglês.
A gente acha que — a gente está no Brasil — é importante cantar em
português. De vez em quando, é legal cantar músicas em inglês, para se
divertir e tudo. Mas, criar em inglês eu acho uma coisa meio esquisita. (1992)
[ Quando você canta em português, dá para você ter a certeza de que
as pessoas estão entendendo tudo o que você está falando. Aí, quando
você canta em inglês, parece que você está cantando sozinho. (1992)
[ Eu acho que cantar em inglês é muito fácil. Não tenho nada contra
quem canta em inglês, porque eu até entendo. Mas dá agonia, porque
eu entendo inglês, mas eu não entendo por que essas bandas cantam
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em inglês. Eu sinto que o que aparece é assim: "Vamos cantar em inglês porque deu
certo". Eu, não. É bom cantar em inglês porque a gente acredita nisso. Que nem o
Sepultura. (1994)
INÍCIO DE TUDO
[ "Era uma vez a gente. Depois, mais gente, e mais gente, e muito mais
gente (não é tanta gente assim; tem muito mais gente do que tem, na
verdade). Era uma cidade. Quer dizer: antes, uma colina. Só que a colina
era pequena e era uma panela. Descemos da colina tal qual bandeirantes
(esta frase horrível foi idéia do Dinho). Onde é que a gente está mesmo?
No porão do Cafofo, lutando contra tudo e contra todos —
principalmente contra os microfones. Aparece M. Bonfá (que país é
este?), estamos em 1979. Alguns espécimes voltam do velho continente
e trazem boas novas. Formam-se bandas novas: AE, Blitx 64, Metralhaz,
Vigaristas de Istambul, Dado e o Reino Animal, confusão geral. Muitas
entradas e bandeiras e, finalmente, do caos nascem: Plebe Rude, Sia
Techno II, o novo Blitx, Bambino e os Marginais, Capital Inicial e Legião
Urbana...De hoje em diante, Roberto Carlos não recebe mais visitantes
em seu túmulo: todas as pessoas estão em casa, dentes cerrados,
nervosismo à flor da pele, perguntando: 'Mas quando será a próxima
apresentação da Legião Urbana?'." [Trechos de um texto escrito por ele
para registrar os primeiros passos da Legião Urbana] (1982)
[ Além de não encontrar músicos, os que eu encontrava não sabiam o
que era rock, ou não gostavam. Eu mesmo não sabia tocar. Fiquei um
ano para tirar Blackbird, dos Beatles. Era muito, muito difícil. Até que
apareceram os Pistols, fazendo três acordes e falando: "Olha, vocês
podem pegar um instrumento e fazer três acordes". E era isso que a
gente fazia. Ficávamos tocando a tarde inteira a mesma música — a dos
Slaughter and the Dogs. Imagine um banda chamada Matança e Seus
Cachorros. Era o máximo! A gente adorava! Tinham esses, os Saints,
Damned, Buzzcocks, mas o que a gente mais gostava, o mais fácil de
tocar, era Ramones. Uma tarde inteira tocando Now I wanna sniff some
glue! Parava, voltava. "Não é assim. Pára. Um, dois, três, quatro, cinco,
seis, sete, oito... Não, pára! Volta!". Fazíamos apenas um lanche e
voltávamos. Porque, naquela época, não tinha muita droga. A gente só
pensava nisso — música e banda. (1989)
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[ O nome Legião Urbana é por causa da turma e porque éramos da
cidade. Eu sempre inventava nomes para a turma. Era para ser
Organização do Desespero, OD. Mas aí as pessoas falaram: "Pô, Renato!
Que nada! A gente não é dessa turma!". Depois, foi Sociedade Pré-
Cambriana. Não deu certo, e a organização virou desorganização. (1989)
[ Antes da entrada do Dado, chamamos um carinha chamado Eduardo
Paraná. Ele era meio jazz-fusion, mas era bonitinho. E tinha um
tecladista, o Paulo Paulista, que só entrou na banda porque tinha um
tecladinho. A gente não aproveitou nenhuma das músicas que fez nessa
época. Eram muito pop. Eu escolhia todos os meninos bonitinhos e via
se tinham um mínimo de talento musical. Tinha um menino chamado
Beto Pastel, que era um homem lindo, mas não sabia tocar nada. (1995)
[ A gente sempre mimeografava as letras e um general pegou a letra de
Música urbana, que falava: "Os PMs armados e as tropas de choque
vomitam música urbana". Só que a gente era supercomportado no palco.
Então, eles acharam que quem tinha feito o panfleto havia sido a Plebe
Rude. (1995)
INSEGURANÇA
[ Nós somos um pouco inseguros, já levamos tanto na cabeça! A gente
sempre acha assim: "Será que eles ainda gostam da gente?" (1995)
[ Eu era muito inseguro. Porque sempre soube que era gay. Sempre. O
mundo me dizia que eu era doente, perver t ido. Quer ia ser
completamente diferente e, ao mesmo tempo, aceito pelas pessoas.
Mas isso faz tanto tempo! Acho que fui adolescente até os 26 anos.
(1995)
INSPIRAÇÃO
[ Para inspiração, eu bebo em diversas fontes. Leio muito a Bíblia, Lao-
Tsé, o Tao Te-kíng, porque acho que ali estão as coisas básicas.
Atualmente, eu também leio coisas "B" — Stephen King — ou então
biografias, da Glória Swanson, do Cecil B. De Mille. Quando era garoto,
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eu lia demais, principalmente os existencialistas. Dizem que o Kierkegaard era
existencialista. Eu o lia, lia muito o Sartre, tudo temperado com Thomas Mann. Já viu,
não é? Ficou muito complicado. Até que reli a Bíblia, e vi no Eclesiastes coisas tão
básicas... E, se é para conhecer o processo humano, eu prefiro uma boa literatura, um
Dostoiévski, um Balzac, em vez de História da sexualidade. (1988)
[ No centro de tratamento onde fiquei dois meses [para se livrar das
drogas], contavam histórias do Raul Seixas. Ele não conseguiu parar
porque achava que, se não tivesse aquela postura, não conseguiria fazer
música. Para mim, parar não mudou nada, a não ser que, ao invés de
ficar sofrendo dois anos para fazer um disco, eu sento e, se a inspiração
não veio, tchau, vou passear. (1994)
[ Essa idéia de que você estar calibrado, ou usar substâncias químicas
de qualquer tipo, aumenta a inspiração não é verdade. Mas, quando a
pessoa bebe, usa drogas e tudo o mais, ela naturalmente vai viver certas
experiências que a pessoa careta não vai. Eu me metia em uns buracos,
conhecia umas pessoas estranhas... Se eu fico na Galeria Alaska até as
seis horas da manhã, vou ter uma visão diferente de quem acorda cedo
e pega sol. Algumas pessoas acreditam que isso afete o trabalho, mas eu
acredito que não. A inspiração é uma coisa que não dá para você forçar.
Para mim, geralmente vem quando eu estou tentando dormir. Justo o
contrário, quando eu usava droga para tentar trabalhar, o resultado ficava
mais lento e disperso. Já teve vez em que tomei ácido e escrevi para
caramba. Na hora, você acha uma obra-prima, mas, no dia seguinte, vê
que não tem nada ali. Em geral, atrapalha tudo. Você usar alguma coisa
durante a mixagem, por exemplo, é um caos. (1995)
INTELECTUAL
[ Sempre fui mais estranho do que qualquer outra coisa. Era muito...
não sei se intelectualizado é a palavra certa, mas eu lia muito. Teve um
dia, na aula de Literatura, que o professor pediu para escrever numa
folha de papel todos os livros que já havíamos lido. Eu disse: "Impossível.
Em uma folha só não cabe". (1995)
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INTELIGENTE
[ As fãs dizem assim: "O mais bonito é o Dado, o Bonfá também é
lindo. Mas o Renato é o mais inteligente". Deixa elas pensarem... (1992)
I
NTÉRPRETE
[ Isso não me preocupa. Um dia, dizem que sou o melhor intérprete;
depois, que somos uma droga. É aquela coisa de ser comparado ao U2.
Cruzes! Eduardo e Mônica é Mamas and Papas. (1994)
INTERRUPÇÕES NA CARREIRA
[ Estamos num período de reflexão, queremos ver o que está
acontecendo. Assim que a gente souber o que quer, a gente faz. Ainda
não encontramos nenhum fio, do modo como o primeiro disco era
porradão e o segundo, introspectivo. As músicas não têm nada a ver
uma com a outra. Prefiro passar três anos sem lançar disco do que colocar
em jogo tudo o que fizemos até agora. É uma linha muito frágil. A
pressa passa, mas a porcaria fica. (1987)
[ Hoje em dia, a gente sabe que foi uma coisa supernecessária parar. O
que dava medo é que não estávamos mais trabalhando intuitivamente.
Eu havia perdido contato total com a intuição, por causa das drogas,
por causa do corre-corre... É horrível! De repente, só trabalhamos assim
porque não somos músicos, não sabemos tocar direito. Se não estivermos
bem com a gente mesmo, não sai. (1988)
[ Um dia, talvez, a gente acabe com a banda e procure outras coisas
para fazer. Mas, se a gente tivesse acabado agora, iria ser um baita pontapé
em todas as pessoas que acreditaram na gente. (1988)
IRONIA
[ Aqui no Brasil, tem muito dessa coisa de humor, da sátira, da ironia,
e a gente usa a ironia de uma forma diferente. Não diria sofisticada,
porque seria a gente se achar metido a besta, e eu acho que a gente é
140
uma banda comum, como as outras. Mas a gente tem uma coisa diferente. Por
exemplo, você tem uma música como vaquinha Mary Lou e a galinha Sara Lee, que faz
o maior sucesso, todo mundo dança e se diverte, e é uma coisa irônica. Agora, a ironia
da gente é fazer uma música chamada Baader-meinhof blues: é um outro nível, envolve
um outro tipo de informação. (1985)
ITÁLIA
[ Foi bom conhecer o país, sentir o cheiro da terra, ver como as pessoas
andam na rua, ouvir o som do idioma para ficar com espírito italiano.
(1995)
[ Os italianos têm esse trauma de ser o terceiro mundo da Europa, que é uma coisa
completamente imbecil. Mas eles têm um pouco disso e admiram muito o pessoal da
Escandinávia, os ingleses e os alemães. Eles sempre se acham meio para trás, eles
sempre se acham um pouco bregas — porque eles são... Eles não têm o que a gente
tem aqui no Brasil, por ter conseguido transcender. Nunca que lá vai aparecer um
Sepultura. Raimundos, então, nem pensar. Chico Science, Planet Hemp... Nem
Camisa de Vênus, entende? (1995)
[ Os artistas italianos são um pouco intocáveis, com limousine etc. É lá o jeito deles,
eles são estrelas, realmente. (1995)
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