ESCUTAS AUTORIZADAS DA INVESTIGAÇÃO DO ‘CASO DÉCIO’
Ao menos outros 3 supostos agiotas – entre eles um juiz e um
deputado estadual – aparecem nas escutas da polícia feitas após o assassinato
de Décio Sá; as interceptações foram denominadas ‘Operação Blogueiro’
Sete suspeitos de atuar como agiotas foram ‘grampeados’
durante dois meses de 2012 (maio e junho) pela Polícia Civil do Maranhão. As
escutas telefônicas fizeram parte de uma operação denominada ‘Blogueiro’, a
cujas degravações o Jornal Pequeno teve acesso. Elas foram pedidas à Justiça
pela comissão de seis delegados que investigou o assassinato do jornalista
Décio Sá, ocorrido em abril do ano passado. A juíza Alice de Sousa Rocha, então
titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri, autorizou. Além de Gláucio Alencar
Pontes de Carvalho e seu pai José de Alencar Miranda Carvalho, foram
‘grampeados’ Pedro Alberto Teles de Sousa (filho do ex-prefeito de Barra do
Corda, José Mariano de Sousa, o ‘Nenzim’, e irmão do deputado estadual Rigo Teles,
ambos do PV); Eduardo José Barros Costa, o ‘Eduardo DP’ (filho da ex-prefeita
Arlene Costa, de Dom Pedro); Josival Cavalcanti da Silva, o ‘Pacovan’ (que,
conforme a polícia, disputava negociatas em prefeituras do Maranhão com Gláucio
Alencar e seu pai, Miranda); Paulo Roberto Pinto Lima, o ‘Carioca’ (ligado a
Pedro Teles, segundo apurou a polícia); e Ronaldo Henrique Santos Ribeiro
(advogado, indiciado pela polícia e denunciado pelo Ministério Público por
envolvimento em agiotagem nas prefeituras e no assassinato de Décio Sá).
No bojo das escutas da ‘Operação Blogueiro’, também aparecem
os nomes do juiz de Caxias Sidarta Gautama Farias Maranhão e do deputado
estadual Marcos Antonio de Carvalho Caldas (PRB).
Em janeiro de 2010, o magistrado foi flagrado em ‘grampos’
da Polícia Federal em conversas com ‘Eduardo DP’ que revelavam indícios de
agiotagem.
Por envolver um juiz, o caso foi levado à Corregedoria do
Tribunal de Justiça do Maranhão, que em fevereiro passado decidiu arquivar o
pedido de abertura de processo administrativo disciplinar contra Sidarta.
Nas escutas da ‘Operação Blogueiro’, o juiz Sidarta Gautama
teve ‘grampeado’ um diálogo que teve em 17 de junho de 2012 com Pedro Teles. ‘O
Charles sumiu do mapa (…) e ficou me devendo um monte dinheiro’, afirma
Sidarta. Não fica claro na conversa quem é Charles. Pedro Teles responde que
‘aquele que mataram lá em Teresina [Fábio Brasil] também deu um monte de
prejuízo’ e diz que quer falar com Sidarta pessoalmente.
Pedro Teles foi condenado, no início do mês passado, a 21
anos de prisão, como mandante da morte do líder comunitário Miguel Pereira
Araújo, o ‘Miguelzinho’, assassinado em 1998, em Barra do Corda. Seus advogados
recorreram e ele espera o resultado do recurso em liberdade. No dia do
assassinato de Décio Sá, Pedro Teles entrou em contato telefônico com Raimundo
Chaves Sales Júnior, o ‘Júnior Bolinha’, um dos principais envolvidos no
homicídio.
Quanto a Marcos Caldas, que tem sua base política no
município de Brejo, ele já foi sócio de ‘Júnior Bolinha’ numa loja de revenda
de carros na Avenida dos Africanos (São Luís).
Segundo o que disse à polícia Patrícia Gracielli Aranha
Martins, viúva do negociante de carros Fábio dos Santos Brasil Filho, o ‘Fabinho’
(assassinado em Teresina no fim de março de 2012), o parlamentar fazia
empréstimos a juros. Ele teria emprestado R$ 60 mil a ‘Fabinho’ – um dos muitos
que o empresário morreu sem quitar.
Nos ‘grampos’ da ‘Operação Blogueiro’, Marcos Caldas conversa
várias vezes com um dos indiciados do ‘caso Décio’, o advogado Ronaldo Ribeiro.
Numa dessas conversas, ocorrida em 13 de junho de 2012 – dia das prisões dos
acusados de envolvimento no assassinato do jornalista –, o parlamentar fala que
‘tem um dinheiro com Gláucio pra receber de uma casa’.
‘Galinhas’ e ‘tomates’ – Diálogos interceptados de Gláucio
Alencar, José Miranda, Paulo Roberto Pinto Lima, o ‘Carioca’, e Eduardo José
Barros Costa, o ‘Eduardo DP’, também revelam fortes suspeitas de prática de
agiotagem, embora – assim como no resto nos demais ‘grampos’ – houve um cuidado
especial dos ‘alvos’ para que não aparecessem relações escusas dos supostos
agiotas com prefeituras. Os quatro tratam mais de empréstimos pessoais a juros
escorchantes e negócios com veículos.
Um raro caso em que a agiotagem nas prefeituras aparece é
num diálogo, ocorrido em 26 de junho de 2012, entre ‘Eduardo DP’ e um homem
identificado apenas como ‘Zé’. Na conversa ‘grampeada’, fala sobre seis cheques
de R$ 600 mil cada da merenda escolar de Dom Pedro, que estariam nas mãos de
Gláucio Alencar e foram apreendidos pela polícia.
Em outros diálogos, mais precavido, ‘Eduardo DP’ usa
‘galinhas’ e ‘tomates’ como códigos para evitar falar em dinheiro:
‘Galinha de dois, três mil contos não dá. Fala pra ver se
come uma de cinco’ (16 de junho de 2012); ‘Preço do tomate: 35 e 32′ (20 de
junho de 2012).
Já ‘Carioca, numa conversa com um certo Paulo, gravada em 31
de maio de 2012, é questionado ‘se tem moral com Alexandre, que está devendo R$
15 mil para seu amigo Daniel, da Rivel’. ‘Carioca’ responde que ‘tem que armar
para tomar o carro dele, pois ele tem que pagar’.
Truculência nas cobranças também é demonstrada por Josival
Cavalcanti da Silva, o ‘Pacovan’. Conversando com um devedor, em 11 de junho de
2012, ele decreta: ‘Veja o que tu tem aí. Eu só quero o meu dinheiro. Vende o
que tu quiser, casa, carro…’
‘Todos vão responder’ – Falando ao JP sobre as investigações
da agiotagem no Maranhão, o delegado Augusto Barros, titular da Seic
(Superintendência Estadual de Investigações Criminais), disse que ‘num primeiro
momento, o foco investigativo é o núcleo chefiado por Gláucio Alencar e seu
pai, mas a seguir todos os esquemas de agiotagem no estado serão
desarticulados’.
O delegado afirmou que ‘nenhum envolvido nesse tipo de crime
vai poder ficar tranquilo, pois todos vão ser presos e terão de responder na
Justiça, independentemente de serem ou não ‘figurões’ conhecidos da sociedade
maranhense’.
Quatro blogueiros e viúva de Décio Sá também foram
‘grampeados’
O blogueiro Luís Assis Cardoso Silva (Luís Cardoso) e seus
filhos Luís Pablo Conceição Almeida e Hilton Ferreira Neto (Neto Ferreira),
também possuidores de blogs, assim como Marcelo Augusto Gomes Vieira, foram
‘grampeados’ na ‘Operação Blogueiro’ nas investigações do ‘caso Décio Sá’. A
viúva do jornalista, Silvana Cardoso da Cruz, igualmente teve seus telefones
interceptados.
A polícia pediu as interceptações porque viu ‘fortes
indícios de suspeição’ (palavras constantes do pedido à Justiça), em certas
atitudes dos blogueiros – que na noite do crime estavam reunidos no Restaurante
Dona Maria (Calhau), para onde Décio Sá iria, antes de mudar o rumo para o Bar
Estrela do Mar (Litorânea), onde foi assassinado.
Luís Cardoso, que marcou o encontro com Décio no Dona Maria,
omitiu, em seu depoimento à polícia, dois números de celulares.
Luís Pablo entrou em contato por celular com o advogado
Ronaldo Henrique Santos Ribeiro (um dos 12 denunciados pelo assassinato) às
22h26, ou seja, em cima da hora do crime. Ronaldo retornou para Luís Pablo logo
após.
Tanto Luís Pablo como Luís Cardoso eram amigos de Paulo
Roberto Pinto Lima, o ‘Carioca’, amizade que acabou em fevereiro de 2012,
quando ‘Carioca’ registrou uma ocorrência no Plantão da Beira-Mar contra pai e
filho, que teriam comprado R$ 30 mil em roupas com um cartão de crédito
emprestado por ‘Carioca’ e pago a ele apenas R$ 9.200.
Marcelo Vieira foi ameaçado, em agosto de 2011, por Gláucio
Alencar e dois seguranças (‘Alemão’ e Laércio) quando almoçava com ‘Carioca’ no
restaurante ‘Cabana do Sol’ (Praia de São Marcos). Gláucio teria se irritado
com postagens sobre ele no blog de Marcelo. No mesmo dia da altercação, sob a
intermediação do juiz Sidarta Gautama, Marcelo foi ao apartamento de Gláucio.
Depois da ‘conversa’, o blogueiro nunca mais postou nada mencionando o suposto
agiota.
Já a viúva de Décio Sá, Silvana Cardoso da Cruz, foi
‘grampeada’, segundo a polícia, porque resistiu a entregar à polícia a CPU do
jornalista, que estava em sua casa, e outros pertences de Décio, como o carro
(Fox prata), uma bolsa, um pen drive e um notebook. Nos ‘grampos’ da ‘Operação
Blogueiro’, Silvana revela, numa conversa com o também blogueiro Hostílio Caio
Pereira da Costa, ocorrida em 30 de maio de 2012, que um dos irmãos de Décio, o
policial militar Plínio Leite de Sá, pegou o carro, a bolsa e o pen drive antes
da perícia, na noite do crime, e chegou a lavar o carro. Silvana afirmou,
ainda, no diálogo com Hostílio, que Plínio também teria mexido na bolsa e até
no conteúdo do pen drive.
Além das pessoas já mencionadas, também foram ‘grampeadas’
na ‘Operação Blogueiro’ ao menos outras dez: Raimundo Chaves Sales Júnior
(‘Júnior Bolinha’); Fábio Aurélio do Lago e Silva (‘Buchecha’); Alcides Nunes
da Silva (investigador afastado da Seic); Paulo Cícero Farias Venturini
(negociante de carros de São Luís); Patrícia Gracielli Aranha Martins;
Aristides Milhomem de Sousa (ex-vice-prefeito de Barra do Corda); Joab Jeremias
Pereira de Castro (soldado da PM reformado e secretário de Comunicação do
Partido dos Trabalhadores); Hélcio Menezes (funcionário de Gláucio Alencar);
Marcelo Minardi (ex-assessor da prefeitura da Paço do Lumiar); e Francisco das
Chagas (dono do Restaurante Dona Maria) (Oswaldo Viviani)
‘Décio tinha um ‘négócio fixo’, que vinha do Senado’, diz
Luís Cardoso
Numa conversa ‘grampeada’ durante a ‘Operação Blogueiro’, o
jornalista e blogueiro Luís Cardoso revela a um interlocutor de nome Matias que
o jornalista e também blogueiro Décio Sá recebia dinheiro do Senado Federal.
‘Ele tinha um ‘negócio fixo’ que vinha do Senado. Vinha
direto na conta’, diz Cardoso a Matias em 2 de junho de 2012.
‘É por isso que nem Roseana [Sarney, governadora do
Maranhão] segurava. Nem ela fez o cara parar’, completa Luís Cardoso.
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